
Quinze dias passados e os pombinhos andam desatinados. Convidei-os para um jantar arriscado. Ele fala muito, ela tenta ser simpática mas as frases mais arrevesadas tornam-se impossíveis de traduzir, ela desconfia das nossas risadas e não sabe como agir. Os olhos varrem-nos a todos num vaivém imparável debaixo de um sobrolho quase sempre franzido. Tem frio; aconchego-lhe um casaquinho a que pedi o amor e liguei-lhe o POCCNR24 para se entreter.
Uma semana depois disso e ela ainda amarra o burro - os tradutores automáticos não estão a ser eficazes, as gavetas dele estão atulhadas de um passado que ela queria que ele não tivesse tido e mete-se na cama, zangada com o mundo. Atendendo a que o mundo dela é ele, está, de um modo geral, zangada em permanência. O quotidiano revela-se difícil, confessa-me ele. A interprete não-colaborante no casamento, vê-se agora, não percebeu nada do que traduziu no momento. Qualquer programa de computador teria tido melhor papel: a estrangeira não percebeu que ia entrar no mundo das autoridades portuguesas e sentir-se uma traça dentro de um novelo de lã, roendo, roendo, roendo sem nada conseguir. Querem agora devolvê-la à procedência para tirar novos documentos porque tem um apelido que não combina com o de nascimento. O pior disto é que tudo podia ter sido evitado se a tradutora não estivesse tão preocupada com as voltas da ècharpe Yves Saint Laurent... Como em todas as histórias, há sempre alguém a estragar a festa.
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