07 março 2015

HÁ LUGARES MAIS PRÓPRIOS

Sempre que me encontro com um vizinho na entrada do prédio e entabulamos conversa nunca é por muito tempo. O lugar é desacolhedor e frio e fica na rota de passagem de todos os habitantes do prédio, visitas e tarefeiros. Não lembraria, portanto, a ninguém, marcar um encontro com alguém dizendo, encontramo-nos à porta.
Apesar disso, é ali que se dão as reuniões de condóminos. O único mobiliário existente é uma mesa de secretária que serve somente para rascunhar as actas e segurar dossiers e uma cadeira onde se senta o escrivão. Em pé, no lugar onde o vento mais corre, encostam-se inquilinos. Outros sentam-se nos gélidos degraus de mármore em cima de uma velha revista.
Há uma excepção: dona Irene traz de sua casa uma bonita cadeira, com almofada de folho e uma almofada extra pois sofre de hemorroidal. Senta-se sempre no mesmo local e não deixa em casa a sua mala, apesar de morar três pisos acima. Interessa-se por todos os temas mas o que mais aprecia é o da manutenção dos administração e do delegado pois este garantiu-lhe que muda, ele próprio, as lâmpadas das escadas.
Atravessar o átrio durante uma tarde de reunião e confrangedor. Lembro-me daquela vez em que, por ter muito trabalho a fazer, faltei à reunião, mas tinha-me esquecido que precisava sair com os cães. Senti que as paredes se juntavam conforme ia avançando entre as pessoas até à porta da rua.
As vizinhas do rés do chão atravessam em passo de corrida, as três, mãe e filhas, em passo de corrida. Terão desejado sair de casa atempadamente, sem ter de passar por aquele aperto. Devem alguns milhares de euros ao condomínio e não fazem tenção de pagar. No entanto, não dirigem nem uma palavra de agradecimento a todos nós por lhes permitirmos continuar a habitar no prédio.
É sempre bom contar que alguém terá o admirável o prazer em apresentar obstáculos ao andamento dos assuntos. Emperra-se meia hora a discutir temas sem importância apenas porque são apresentados pelo Zé e o Zé gagueja... Dói esperar aquilo que todos sabem que vão ouvir; o seu tom de voz sobe e desce até encontrar o tom que permite soltar o som que afinal só servir para baralhar ainda mais...
Desta vez a reunião não correu mal nem se prolongou infinitamente como outras houve.
A pessoa ao  meu lado tem os pés gelados.

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